O caso Dina
Já que tantas pessoas estão falando sobre a Dina e seus polêmicos trajes, vou deixar aqui uma entrevista em que ela explica algumas coisas bem básicas. Farei a tradução abaixo.
Pessoal, o mundo já é bem machista e moralista. O Egito e os países árabes o são. Vamos tentar aprofundar um pouco.
Uma artista com a visibilidade e experiência dela sabe exatamente que figurinos está usando e tem um motivo para isso.
Discussões e xingamentos bem-vindos nos comentários. Conversa inteligente também.
Abraços!
Rebeca
[Atualização] O vídeo com a entrevista foi tirado do ar recentemente, mas manterei abaixo a transcrição que havia feito.
Entrevistador: É justo dizer que a Dina, sua presença, suas roupas podem causar escândalo e caos?
Dina: Eu estava vestindo jeans e camiseta aquele dia. Qualquer garota andando na rua pode vestir isso. Eu não estava com trajes de dança na estreia do filme. Eu sei o que vestir e quando vestir.
Entrevistador: Então você não é a causa dos incidentes com abusos sexuais em Wast el Balad.
Dina: Não. Eu juro por Deus que não sou a causa. Talvez aqueles homens sejam sexualmente reprimidos.
[…] Ninguém pode mudar sua moral e ética se você já estiver confiante de que eles são bons. Se eu tenho uma moral sólida eu não a mudarei por causa de más palavras que vc diga ou maus atos que você cometa.
Entrevistador: Quando você dançou numa festa de faculdade em um hotel, as pessoas disseram que você está destruindo a educação no Egito e corrompendo a juventude. Pessoas abriram processos contra você e todos queriam saber quem lhe autorizou a dançar para estes estudantes.
Dina: Você sabe em quantas festas de faculdade eu já dancei?
Entrevistador: Cinco ou seis vezes?
Dina: Se não 300, então 400. Danço há muito tempo! Um ano dancei numa festa de faculdade com o Ehab Tawfic e o Mustafa Amar em Masr el Gedida. É normal. Essas festas não são recebidas pela faculdade, os próprios estudantes se organizam e juntam dinheiro para festa. Por que as pessoas estão fazendo tanto barulho agora por causa de algo que eu faço há tantos anos?
Entrevistador: Ok, mas estão dizendo.
Dina: O que isso significa? Estamos voltando 70 anos no tempo ou andando um ano para frente? Estamos progredindo? Nós nos tornamos tão mente fechada que tudo sobre o que vamos falar é sobre estudantes organizando festas e se divertindo? Eu fiz muitas festas de faculdade antes e ninguém nunca escreveu nada sobre isso.
Entrevistador: Mas o que isso está ensinando para os estudantes, ou que algumas pessoas podem dizer?
Dina: Isso os ensina a dançar e ensina que a dança é a coisa mais importante do mundo. A música alimenta a alma e a dança alimenta o corpo.
Entrevistador: Eles podem dizer que isso é ensinar maus costumes.
Dina: Por quê? Eu tenho dois chifres vermelhos e um rabo? Estou segurando uma forquilha? Estou segurando uma garrafa de whisky na mão e me juntando aos estudantes? Eu não tenho nada a ver com essas coisas. Meu trabalho é dançar, e dançar é característica de todos os países. Se eu mencionar samba você imediatamente dirá “Brasil”! Se eu disser Dança Oriental você imediatamente dirá “Egito!”. Concordem ou não, é a dança de nosso país […] Por que nós nos sentimos envergonhados por isso?
O caso Dina by Rebeca Bayeh is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License.
Oi Rebeca! estou adorando seu blog!
Conheci a Dina em 2005, no workshop da Luxor, na época organizado pela Hayat.
Ela como professora é muito exigente, e aprendi muito com ela em 4 dias.
E é emocionante vê-la dançar. Acho que as pessoas se apegam aos detalhes e esquecem o essencial, e se vc não vê-la ao vivo, não sabe o que é sua dança, é muito sentimento, é de arrepiar.
E ela tem muita técnica sim. Conheci a Jade pessoalmente nesse workshop, ela tbm estava participando, ela e Shahar.
parabéns por postar algo tão polêmico.
beijos
Sandra Kussunoki
Que legal, Sandra!
É polêmico mesmo, e é por isso que temos que falar abertamente. Para nos posicionar, para encontrar pessoas que pensam parecido e claro, para não virar tabu!
Tabus não trazem nada de construtivo para um grupo e muitas vezes impedem que pensemos com profundidade num assunto.
Abraço forte em você e seja bem-vinda!!
Nossa… o adorei a entrevista! Mas também, virei fã da Dina já há algum tempo e acho que ela é muito inteligente e tem muita coisa interessante a dizer (além de dançar divinamente).
Em sala de aula, quando alguém levanta a “questão Dina” eu sempre digo que ela é uma espécie de válvula de escape do Egito, porque não importa o quão bizarra seja a roupa que ela está usando, o povo simplesmente a adora. Ela é uma visão rara no Egito de uma mulher independente e “selvagem” que muitos homens e mulheres gostariam de ver mais ou ser sem sofrer julgamentos por isso. Por isso ela é tão fascinante para eles.
O pessoal conservador julga? Claro. Mas eles julgaria a Dina de qualquer jeito, estivesse ela com uma roupa presa por alfinetes gigantes e uma mega fenda ou uma burca, só porque de uma forma ou de outra ela foge aos padrões esperados de uma mulher egípcia (ou muçulmana, enfim).
E não podemos nos esquecer que também temos diversos casos desse tipo de julgamento no nosso falado “mundo evoluído” também, o que o entrevistador menciona que falaram da Dina é a mesma ladainha que se escuta absolutamente toda vez que uma mulher é assediada no Ocidente (especialmente nos casos de estupro).
Infelizmente vivemos num mundo machista, mas graças a deus temos Dinas para nos ajudar a mudar 🙂
Parabéns pelo blog Rebeca!
Concordo com você Laura. Presencio com frequência manifestações bizarras de conservadorismo por aqui, um país supostamente liberal.
Mas como você disse, no Egito o apelo é maior. Há leis e há polícia específicos para os trajes das bailarinas.
A Dina fala sobre essa relação de “amor e ódio” dos egípcios com relação à Dança Oriental. É uma paixão nacional e ao mesmo tempo é um tabu.
Obrigada pelos comentários, Laura!
Eu também tive o prazer de fazer o work da Dina em 2005. Fiquei encantada com sua forma de ensinar, com sua dança emocionante e principalmente com sua humildade, para vcs terem uma idéia ela fez varios works de outros professores coisa que muitas bailocas que se “acham” não tem coragem de fazer pois se consideram superiores. Geralmente quem gosta de Julgar, criticar não olha para si mesmo.Hoje em dia vc ve muitas Dinas por ai mas com uma diferença não chegam aos pés dela.
Que lindo, Layllah!
Esse tipo de postura é realmente inspirador. Vejo no mercado muito “já sou top, não posso mais aparecer fazendo isso” e pouco “nunca parei de estudar e isso me faz crescer ainda mais”.
Seja muito bem-vinda ao Almanack!
Um beijo!
Rebeca